Acordo nuclear entre Brasil e Alemanha completa 50 anos envolto em críticas, promessas não cumpridas e bilhões desperdiçados. Assinado em 27 de junho de 1975, sob o governo do general Ernesto Geisel, o tratado previa a construção de oito usinas nucleares no Brasil com tecnologia alemã. Apenas uma, Angra 2, entrou em operação – quase três décadas depois. Angra 3, por sua vez, consome recursos desde 1986 e ainda não foi finalizada. A pergunta que persiste: quem é o responsável pelo fiasco nuclear brasileiro?
Segundo estudo publicado na revista Science and Public Policy, assinado por pesquisadores da UFMG, o principal culpado foi o próprio regime militar. “Faltou interlocução com a academia, o empresariado e a sociedade”, afirma João Paulo Nicolini, autor do artigo. A pesquisa destaca que a decisão de investir numa tecnologia experimental (jet-nozzle), sob pressão dos EUA e sem debate público, foi desastrosa – e simboliza o estilo autoritário e centralizador da época.
Além dos problemas técnicos, o acordo favoreceu amplamente empresas e bancos alemães. A Kraftwerk Union (da Siemens) e instituições financeiras lucraram com empréstimos e vendas superfaturadas. Enquanto isso, no Brasil, empreiteiras como a Odebrecht cresceram sem licitação, sob o guarda-chuva estatal e a ausência de fiscalização. O programa paralelo criado em segredo pelos militares jamais atingiu capacidade produtiva real, embora tenha inspirado o futuro submarino nuclear, previsto agora para 2040.
A falta de transparência foi uma constante. A imprensa brasileira noticiou o acordo somente após a assinatura, e o Parlamento jamais discutiu sua viabilidade. Em países democráticos, o cenário poderia ter sido outro. “Foi a natureza antidemocrática do regime que permitiu a imposição de um acordo claramente prejudicial ao Brasil”, aponta a historiadora Helen Nunes. Até mesmo CPI no final da ditadura terminou sem consequências concretas.
Hoje, o chamado “Negócio do Século” sobrevive como um peso orçamentário e um símbolo da ineficiência estatal. Em 2024, o Parlamento alemão voltou a debater a revogação unilateral do acordo, mas preferiu mantê-lo. Do lado brasileiro, romper o tratado implicaria abandonar Angra 3, um projeto que já consumiu bilhões. Como destaca O Farol Diário, o acordo continua vivo, mas por inércia – um exemplo clássico de como o intervencionismo estatal pode transformar ambição em desperdício.