O Farol Diário – A Porsche, ícone da engenharia alemã e símbolo de luxo e velocidade, está diante de um momento decisivo. Após anos de crescimento impulsionado por SUVs e esportivos de alto desempenho, a montadora de Stuttgart enfrenta um cenário desfavorável, com queda nas vendas, desvalorização das ações e dificuldades com a transição para a eletrificação. Como resposta, a empresa estaria considerando uma guinada ousada: investir no setor de defesa, alavancando seu conhecimento técnico em mobilidade avançada, eletrificação e direção autônoma.

Fontes próximas à Porsche SE, holding controladora da marca, apontam que um aporte inicial de pelo menos 2 bilhões de euros está sendo analisado. Embora os executivos da empresa não tenham confirmado oficialmente o projeto, também não descartam os rumores. A ideia seria aproveitar a crescente demanda europeia por sistemas de defesa modernos, impulsionada pelos conflitos recentes e pelo aumento dos orçamentos militares, especialmente na Alemanha.
O momento é oportuno. O governo alemão, sob pressão geopolítica, ampliou seu orçamento de defesa em bilhões de euros. A União Europeia também anunciou um plano de investimentos robusto, liderado por Ursula von der Leyen, com mais de 800 bilhões disponíveis para o setor nos próximos anos. Nesse cenário, a Porsche pode atuar com desenvolvimentos próprios ou em parcerias estratégicas com empresas do setor bélico.
A montadora possui vantagens claras: seus avanços em direção autônoma, sensores LiDAR, radar de alta definição e câmeras integradas já são utilizados em veículos como o Taycan e o novo Macan elétrico. Essas tecnologias podem ser adaptadas para uso militar em veículos táticos autônomos, sistemas de navegação em ambientes hostis e vigilância remota. Além disso, a Porsche domina o uso de materiais ultraleves e compostos de alta resistência, ideais para blindagens móveis com maior eficiência energética.
O setor de análise de dados também pode ser aproveitado. Subsidiárias como a Ituran, especializada em geolocalização e telemetria, poderiam fornecer suporte em operações de inteligência, planejamento de missões e resposta rápida em cenários de combate. Há ainda a possibilidade de utilização de sistemas híbridos ou elétricos para reduzir a assinatura térmica e sonora de veículos militares – uma vantagem estratégica em conflitos modernos.
Historicamente, não seria a primeira vez que a Porsche pisa no terreno militar. Na década de 1930, Ferdinand Porsche foi diretamente envolvido no desenvolvimento de tanques como o Tiger e o Maus, além dos utilitários Kubelwagen e Schwimmwagen, largamente utilizados pelo Exército Alemão. A empresa, portanto, possui familiaridade com os requisitos e dinâmicas do setor, mesmo que, hoje, o foco seja mais tecnológico do que bélico.
Outras marcas já exploram esse caminho. A Renault fabrica o Sherpa 2 e o TRM 2000, ambos veículos militares adaptados. A Mercedes oferece o Classe G em versões militares, além dos lendários caminhões Unimog e Zetros. A italiana Iveco fornece o Lince ao exército espanhol, e até a Lamborghini flertou com o setor nos anos 1980 com o LM002, um off-road com motor V12 criado inicialmente para tentar seduzir o Pentágono.
A Porsche, ao contrário dessas tentativas isoladas, parece mirar algo mais estruturado e de longo prazo. Diante da queda das ações – de €118,90 em 2022 para €43,21 atualmente – e da retração de mais de 25% nas vendas, especialmente na China, a empresa precisa reagir rapidamente. A descontinuação do Macan a combustão e a perda de força do Taycan reforçam a urgência por novos mercados.
Diversificar para sobreviver é a lógica. E se ninguém quer ir à guerra, ao menos a Porsche quer estar preparada para lucrar com ela. Afinal, num mundo onde segurança nacional se tornou prioridade, carros rápidos podem muito bem virar máquinas de guerra discretas, autônomas e, claro, alemãs.