São Paulo — A Operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal em abril, trouxe à tona uma complexa rede de fraudes que envolve entidades associativas e empresas de crédito consignado, em um esquema que pode ter lesado milhões de aposentados do INSS. A investigação foi impulsionada por uma série de reportagens do portal Metrópoles, que revelou como as entidades usaram convênios com o Instituto para impor descontos mensais a segurados, sem autorização expressa deles.
Segundo a PF, há indícios de que essas entidades contratavam empresas de consignado para incluir aposentados em seus quadros de forma compulsória, cobrando mensalidades associativas junto aos benefícios do INSS. O volume movimentado chama atenção: mais de R$ 6,3 bilhões foram arrecadados desde 2019, com indícios de que ao menos R$ 15 milhões foram repassados a empresas de crédito investigadas.
As três principais entidades apontadas no inquérito — Ambec, Unabrasil e Cebap — mantêm vínculos com o empresário Maurício Camisotti e com diretores ligados a empresas do ramo. Os contratos firmados previam bonificações para correspondentes bancários por cada novo aposentado filiado, além de percentuais sobre as mensalidades futuras. Na prática, os empréstimos consignados vinham com um “bônus invisível”: a filiação forçada a associações.
Empresas como a HKM e o Balcão das Oportunidades, ambas com histórico no mercado de consignados e com vínculos passados com o banco BMG, aparecem como beneficiárias diretas de pagamentos milionários. A HKM, ligada ao ex-gerente do BMG Herbert Menocchi, teria recebido repasses por prestar serviços de intermediação na filiação dos segurados.
A Controladoria-Geral da União (CGU) acompanha a investigação e já mapeou movimentações de mais de R$ 320 milhões da associação Amar Brasil, também ligada a empresários do setor. A suspeita é de que o modelo adotado por essas entidades tenha criado um mercado paralelo de exploração de aposentados, com anuência do INSS — cenário que levou à exoneração do presidente do Instituto e do ministro da Previdência.
A equipe de O Farol Diário seguirá acompanhando os desdobramentos do caso, que escancara a fragilidade do sistema previdenciário diante de arranjos entre entidades privadas e o poder público — um exemplo claro de como convênios estatais, sob a justificativa de “representatividade”, podem servir de porta de entrada para abusos sistemáticos.