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Cracolândias à brasileira: como o discurso pró-drogas ampliou a crise nas ruas

Especialistas apontam que a flexibilização das políticas antidrogas contribuiu decisivamente para o aumento da população em situação de rua no Brasil, que já ultrapassa 327 mil pessoas.

Explosão no número de moradores de rua desafia políticas sociais e escancara crise silenciosa
Nas principais capitais do país, a cena se repete com frequência perturbadora: entre marquises, carros e calçadas, cresce o número de pessoas vivendo nas ruas em condições degradantes. Segundo dados mais recentes do Observatório da UFMG, o Brasil fechou 2024 com 327.925 pessoas em situação de rua – um salto de 25% em apenas um ano. Para especialistas ouvidos por O Farol Diário, o fenômeno não pode mais ser atribuído apenas à pobreza ou ao desemprego, mas está diretamente ligado ao avanço da dependência química e à leniência crescente com o uso de drogas.

A flexibilização legal iniciada com a Lei 11.343/06, sancionada ainda no primeiro governo Lula (PT), é apontada como um marco nessa guinada. A norma, que despenalizou o porte de drogas para consumo pessoal, reduziu drasticamente o papel da repressão no combate ao vício. De lá para cá, o discurso da “humanização” do usuário passou a coexistir com a explosão do consumo de entorpecentes e o colapso das ruas, onde miséria, transtornos mentais e vício se entrelaçam.

O secretário de Assistência Social de Florianópolis, Bruno Souza, é um dos que questionam o discurso dominante. Segundo ele, enquanto a economia da região Sul sofre com escassez de mão de obra, a rua segue inchando. Para Souza, trata-se de uma crise moral e de saúde pública agravada por decisões judiciais e culturais que trataram o uso de drogas como um direito pessoal, ignorando seus efeitos destrutivos. “De cada 100 que tentam tratamento voluntário, apenas 10 concluem. E a reincidência é quase total”, lamenta.

O economista Izak Carlos da Silva, do BDMG, vai na mesma direção. Para ele, a falha das políticas públicas não está na ausência de recursos, mas na incapacidade de identificar os dependentes químicos como um grupo que requer abordagem própria. “Não é o sistema econômico que explica esse aumento. É a dependência química. E o Estado não sabe lidar com isso”, alerta. A oferta de auxílios, segundo ele, ignora a realidade de quem já perdeu o vínculo com qualquer estrutura produtiva.

Roberto Motta, especialista em segurança pública, alerta para a “tempestade perfeita” criada pela suavização da legislação, por decisões do STF e pelo incentivo cultural ao consumo, inclusive por celebridades. Segundo ele, sem o medo da punição, o uso cresce. “A lógica que funcionou contra o cigarro foi completamente abandonada em relação às drogas”, afirma. Motta defende uma abordagem mais firme, sem o viés ideológico que, em sua visão, tem tratado o problema como algo inevitável ou mesmo aceitável.

Enquanto o discurso da legalização avança, os números nas calçadas das grandes cidades tornam-se cada vez mais insustentáveis. A crise, segundo os especialistas, não é apenas de renda – mas de rumos. E enquanto o país hesita entre a compaixão e a permissividade, as ruas seguem sendo palco de uma tragédia anunciada.

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