O Farol Diário publica, nesta edição, uma análise profunda sobre a crescente ameaça do crime organizado à democracia brasileira. As eleições municipais de 2024 escancararam um problema que há tempos era ignorado: a tentativa de controle político por facções criminosas. Em cidades como Santa Quitéria, no interior do Ceará, organizações como o Comando Vermelho tentaram interferir diretamente no pleito, ameaçando candidatos, cooptando eleitores e impondo seus próprios representantes.
Casos semelhantes foram relatados em diversos pontos do país. No Rio de Janeiro, relatos de campanhas impedidas de circular em determinadas regiões demonstram como o tráfico impôs fronteiras políticas nas comunidades. Em São Paulo, ao menos 70 candidatos estavam sob suspeita de ligação com o crime organizado — 12 deles acabaram eleitos. A infiltração já não se limita ao apoio indireto, mas passa a ser uma estratégia de ocupação de cargos públicos.
A resposta institucional, embora mais estruturada que em eleições anteriores, ainda é considerada insuficiente. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sob a presidência da ministra Cármen Lúcia, adotou medidas inéditas, como a presença obrigatória de juízes em todos os municípios e a criação de núcleos de inteligência para monitorar candidaturas. A Polícia Federal e o Ministério Público também reforçaram operações, com apreensões milionárias e mais de 2.500 inquéritos instaurados.
A preocupação não é apenas brasileira. A Organização dos Estados Americanos (OEA) alertou para o aumento da violência política e da presença de fundos ilícitos nas campanhas, como recursos oriundos do tráfico de drogas. Relatório da entidade registrou um aumento de quase 60% nos atos violentos contra candidatos em relação ao pleito de 2020 — incluindo ameaças, agressões e assassinatos, como o de João Fernandes, em Nova Iguaçu.
Cientistas políticos alertam que a contenção dessa ameaça depende de duas frentes: medidas repressivas mais eficazes e maior transparência no financiamento de campanhas. O desafio é equilibrar o combate à criminalidade com a preservação de garantias individuais, evitando abusos. Sem reformas profundas e vigilância permanente da sociedade, o crime organizado continuará buscando espaço na política local, onde o controle territorial ainda é mais vulnerável.