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Montadoras chinesas inflam exportações com carros “usados” que nunca rodaram

Estratégia apoiada por governos locais distorce dados, esvazia estoques e gera acusações de dumping em mercados internacionais

Montadoras da China estão utilizando uma prática questionável para inflar artificialmente os números de exportação: veículos zero quilômetro estão sendo registrados como usados e vendidos ao exterior. A manobra, adotada com apoio institucional de governos locais, permite que essas unidades sejam contabilizadas como vendas, apesar de nunca terem circulado em solo chinês.

Segundo levantamento da agência Reuters, cerca de 90% dos 436 mil veículos exportados como “usados” em 2024 estavam, na prática, novos. O processo envolve o emplacamento imediato dos carros nas fábricas, seguido de sua reclassificação formal antes de deixarem o país. A estratégia é usada para aliviar estoques de modelos com baixa demanda, como carros elétricos defasados e veículos a combustão que perderam incentivos fiscais.

Mais de 20 governos provinciais, entre eles Guangdong e Sichuan, estão envolvidos na operação, oferecendo incentivos como licenças especiais, cotas extras e acesso a infraestrutura logística. O estímulo é parte de um esforço para cumprir metas de exportação determinadas por Pequim — metas que influenciam diretamente o financiamento regional e o avanço de lideranças políticas.

No entanto, a prática tem levantado sérias suspeitas de dumping, com países como Rússia e Jordânia reagindo com restrições. Em 2023, Moscou vetou a entrada de veículos “usados” com quilometragem zero, uma tentativa de conter a concorrência desleal. As críticas se intensificam diante da expansão do esquema, que hoje envolve até influenciadores digitais promovendo vendas para pequenos mercados emergentes.

Apesar de ter ultrapassado o Japão como maior exportador de automóveis do mundo, com 6,41 milhões de unidades em 2023, a China agora enfrenta crescente pressão por maior transparência e regulação. A falta de critérios objetivos sobre o que constitui um veículo usado pode comprometer a credibilidade do setor — algo que até lideranças da própria indústria, como o presidente da montadora Changan, já reconhecem publicamente.

O Farol Diário seguirá acompanhando os desdobramentos desse caso, que ilustra bem como distorções econômicas internas podem afetar a confiança em mercados globais.

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